O uso incorreto de defensivos na cultura pode acelerar a seleção de pragas resistentes, reduzindo gradativamente a eficácia das aplicações. Para assegurar a assertividade do controle, o produtor pode adotar boas práticas, como o MIP, e potencializar o monitoramento da área com a agricultura digital
Aplicação de inseticida em talhão de soja
Para preservar os resultados de sua lavoura, o agricultor precisa adotar as melhores estratégias agronômicas, ao longo de toda a safra, para proteger a cultura do ataque de pragas. Caso contrário, a rentabilidade da safra pode ficar comprometida.
De acordo com estudo do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (Esalq/USP), as principais pragas que atacam, por exemplo, as lavouras de soja, milho e algodão no Brasil podem causar perdas médias de produtividade entre 9,5% e 40%, se não forem devidamente controladas.
Com o avanço em estudos e pesquisas sobre defensivos agrícolas, novas moléculas foram descobertas com ação eficaz contra os pequenos inimigos da lavoura. Mas é necessário usá-las com cautela! Caso contrário, o defensivo pode deixar de agir como esperado na área e o produtor pode ter dificuldade de controlar as pragas na propriedade.
Mas será que o inseticida perde mesmo a eficácia? Para responder essa pergunta, entenda o que é resistência de insetos a alguns dos defensivos utilizados no campo. Confira ainda como estruturar o Manejo Integrado de Pragas na fazenda e de que modo a agricultura digital pode ajudar no controle desses inimigos indesejados.
Defensivos agrícolas utilizados no controle de pragas, assim como de doenças e plantas daninhas, têm perdido eficiência no campo. O problema ocorre devido às más práticas de uso, como aplicação do produto sem necessidade, não rotação de modos de ação e monocultivo. Quando pragas – ou mesmo daninhas ou fungos – presentes em uma área não estão mais sendo controlados por um fitossanitário, vale a pena investigar.
Alguns fatores podem estar relacionados à maior dificuldade de controle de uma determinada praga por um inseticida e precisam ser investigados pelo produtor. Sem essa apuração, não se pode, por exemplo, afirmar que, em sua área, uma praga foi selecionada resistente a um produto.
Tais fatores podem ser inerentes às características do próprio inseto, ao produto (ao lote, por exemplo), ao momento em que foi aplicado na área e à tecnologia/operação de aplicação.
A tecnologia de aplicação pode interferir na eficiência quando os equipamentos destinados a essa finalidade encontram-se desregulados, possuem bicos impróprios, são feitas associações usando tanque inadequados, além do uso de pressão e volumes de aplicação incorretos.
Da mesma maneira, a aplicação do defensivo no momento errado, sem considerar os níveis de ação recomendados pelas boas práticas agrícolas, também pode dificultar o controle de pragas, uma vez que determinada praga pode selecionar resistência a um inseticida.
“O fator determinante da evolução da resistência de uma praga a um inseticida é a pressão de seleção, ou seja, o uso contínuo de um mesmo produto sem a implementação efetiva de estratégias de manejo de resistência”, informa Celso Omoto, professor da Esalq-USP, em entrevista à Agência Fapesp.
Esse uso contínuo de defensivos agrícolas em determinado talhão age como uma seleção artificial. É que populações mais sensíveis são controladas a cada vez que se aplica determinado fitossanitário na área, mas alguns indivíduos se selecionam resistentes devido, principalmente, a mudanças genéticas ou de comportamento. Estes sobrevivem e passam essa resistência a seus descendentes. Aí vem outro complicador: o fato de que os insetos se reproduzem rapidamente e em um pequeno espaço de tempo.
“Isso faz com que aumente a proporção de indivíduos resistentes no campo e, gradativamente, a população dessa praga passa a não ser controlada eficientemente com o inseticida naquele local”, explica o professor.
Informações do Portal da Embrapa Soja, divulgadas a produtores da oleaginosa, são enfáticas: nem sempre o inseticida aplicado por um produtor segue as melhores práticas agrícolas. Às vezes, baseia-se apenas no calendário ou aproveita operações que já serão realizadas (junto a herbicidas e/ou fungicidas), sem muitas vezes considerar a presença efetiva das pragas e os possíveis danos que possam causar. Não raramente, faltam critérios técnicos.
Segundo destaca a instituição, quando as melhores práticas não são adotadas, pode ocorrer a eliminação de inimigos naturais e forte desequilíbrio ambiental, podendo favorecer a seleção de insetos resistentes a determinados ingredientes ativos.
Erros na aplicação de inseticidas também se referem à pulverização na lavoura de doses acima ou abaixo do que é descrito na bula do produto e à associação indevida de ingredientes ativos em propriedades agrícolas.
De acordo com o professor da Esalq/USP, a perda da eficácia de fitossanitários é ainda mais grave em países de agricultura tropical, como é o caso do Brasil, que possibilita o cultivo de culturas como milho, soja e algodão o ano inteiro. Com isso, o uso de inseticidas, para combater pragas agrícolas no país, é intensificado, e o problema da resistência desses insetos a esses produtos é muito mais rápido.
Dentre os insetos que apresentam maior potencial para adquirir resistência a defensivos agrícolas, especialmente nas culturas de cereais, é possível dar destaque para o percevejo-marrom (Euschistus heros), a lagarta-falsa-medideira (Chrysodeixis includens), a lagarta helicoverpa (Helicoverpa armigera), a mosca branca (Bemisia tabaci), alguns ácaros, entre outros.
“Temos observado que o problema de falhas de controle de algumas pragas vem se agravando desde 2002, quando começamos a realizar os primeiros ensaios em salas de criação de lagartas e percevejos para avaliar a resistência desses insetos a inseticidas”, relata Daniel Sosa Gomez, pesquisador da Embrapa Soja.
Ele reforça que essa problemática vem crescendo no país em função do uso frequente dos produtos sem respeitar seus níveis de ação, que representam o momento adequado da aplicação do inseticida. Para minimizar o problema, o pesquisador recomenda, como estratégia antirresistência, a alternância de inseticidas com modos de ação diferenciados, assim como o uso de doses recomendadas pela pesquisa.
Mario Eidi Sato, pesquisador do Instituto Biológico de Campinas, vai além. Afirma que, nas últimas décadas, a descoberta de novos inseticidas, de grupos químicos e modo de ação distintos dos inseticidas já existentes no mercado, está se tornando cada vez mais difícil. “Desta forma, o agricultor não tem novas opções quando o produto está apresentando falhas de controle devido à evolução da resistência, e assim o problema se torna evidente.”
Inclusive, falhas na aplicação de defensivos agrícolas no passado acarretaram o aumento de prejuízos com pragas secundárias, que anteriormente não causavam dor de cabeça significativa aos produtores.
Algumas práticas utilizadas para o manejo da resistência são as seguintes: o uso de inseticidas adequados, a alternância de produtos com diferentes modos de ação, o uso de substâncias sinérgicas, a dose adequada dos inseticidas em cada aplicação e medidas que reduzam a pressão de seleção aos indivíduos resistentes da população.
Importantes para prolongar a eficácia dos defensivos agrícolas em determinada área, essas práticas são preconizadas pelo MIP (Manejo Integrado de Pragas), um modelo de produção que traz muito retorno para o produtor agrícola brasileiro.
A implementação do MIP reduziu, em mais de 50%, o uso de inseticidas nas lavouras desde que esse modelo de manejo começou a ser implementado, sem quebra no rendimento de grãos da cultura, segundo o pesquisador Décio Gazzoni, da Embrapa Soja.
De acordo com a Embrapa Soja, o MIP oferece alguns benefícios às culturas agrícolas, tais como:
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Para adotar o Manejo Integrado de Pragas, é necessário conhecer bem a lavoura e as pragas presentes em cada talhão. Posteriormente, para adotar medidas de controle, o produtor precisa estar atento ao Nível de Dano Econômico (NDE), que corresponde a um patamar mínimo de injúria que uma praga causa à cultura e que justifique a aplicação de determinada tática de manejo.
O cálculo do NDE é importante para assegurar que os defensivos sejam utilizados apenas quando necessários e de forma sustentável. E atenção: toda praga tem um nível de dano, ou seja, a partir de uma porcentagem, os danos que provoca à cultura passam a causar “injúrias” financeiras.
Isso significa que não é com a constatação da presença de um percevejo aqui e de uma lagarta acolá que prejuízos econômicos já estão sendo causados, justificando a pulverização. Mas, para que o produtor saiba exatamente o que está acontecendo na sua lavoura, precisa fazer o monitoramento. É essencial para identificar quais pragas estão presentes, qual é a dimensão da infestação e em quais áreas do talhão estão causando problemas.
Monitorar a lavoura é imprescindível para manter a presença dos pequenos inimigos em equilíbrio e se livrar de danos econômicos. As principais formas de monitoramento da área são o pano de batida e o uso de armadilhas. Para potencializar essas técnicas, o agricultor pode usar ainda as ferramentas da agricultura digital.
Após saber exatamente a realidade da infestação dos talhões, o produtor pode escolher o método de controle ideal para a lavoura. É importante agir no momento certo para recuperar o equilíbrio agroecológico. A redução das aplicações de defensivos químicos se deve à variedade de técnicas de controle que o MIP apresenta. Abaixo, estão algumas delas:
Com relação a esta última estratégia de controle, Aline Sandim, doutora em Agronomia pela Unesp de Botucatu, afirma que a aplicação de defensivos também pode ser usada no MIP, mas de uma maneira consciente e sustentável. “Com a recuperação do equilíbrio entre pragas e inimigos naturais, a necessidade de fazer aplicações reduzirá consideravelmente.” Bom para o bolso do produtor, que economiza em aplicações, e importante para prolongar a eficácia dos inseticidas sobre determinada área.
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Para utilizar inseticidas com sustentabilidade econômica e ambiental, maximizando a eficácia do produto na lavoura, o agricultor pode lançar mão da agricultura 4.0. Suas ferramentas tecnológicas podem contribuir com o produtor à medida que potencializam o resultado do monitoramento da lavoura.
A princípio, quem está no campo pode utilizar funcionalidades que o ajudem a priorizar esse monitoramento, a identificar problemas de forma rápida e a tomar medidas com precisão para proteger sua produtividade por meio de imagens de satélite de fácil utilização e de alta qualidade.
Nesse caso, uma boa pedida é o Diagnóstico FieldView™, funcionalidade da plataforma Climate FieldView™, da Bayer, que disponibiliza automaticamente três tipos de imagens para cada talhão cadastrado: Imagem Real, Mapa de Vegetação e Mapa de Monitoramento.
Ao receber as imagens durante o desenvolvimento da cultura, o gestor da fazenda pode priorizar visitas de monitoramento nos talhões e acompanhar o desenvolvimento vegetativo da lavoura, de maneira integrada com outros dados e mapas de FieldView™ ou de parceiros.
Plataformas de agricultura digital, como Climate FieldView™, permitem que o agricultor faça ajustes de dosagens de aplicação de acordo com características das suas zonas de manejo do talhão, ajudando a evitar desperdícios e sobredosagens/ subdosagens que possam contribuir para a seleção de populações resistentes no campo.
De acordo com o monitoramento realizado na área, a plataforma ainda oferece outra funcionalidade: as prescrições manuais de pulverização, que apoiam o direcionamento, de forma mais assertiva, da aplicação de defensivos. Assim, facilita na realização de aplicações customizadas de defensivos, de acordo com a demanda de cada parte do talhão.
Essa é uma ferramenta estratégica quando se objetiva fazer uma aplicação precisa, sem exageros e no momento certo, buscando manter a máxima eficácia dos defensivos sobre as pragas presentes na propriedade.
Dispositivos de mapeamento de operações, como o FieldView™ Drive, possibilitam a geração de mapas de pulverização que mostram para o agricultor possíveis falhas das aplicações, sobreposições, bem como o volume/taxa de aplicação e velocidade do equipamento no momento em que a máquina está trabalhando no campo. Oferecendo uma ampla gama de informações que ajudam a identificar e a corrigir rapidamente as causas de possíveis problemas no controle de pragas ou doenças.
A agricultura digital oferece ao produtor inúmeras ferramentas que permitem otimizar a aplicação de defensivos na lavoura, seja contribuindo com planejamento na compra de insumos, no gerenciamento das operações com o pulverizador em curso e na correção de possíveis falhas.
Plataformas, como Climate FieldView™, permitem o direcionamento de áreas que devem ser monitoradas com mais frequência, o que pode ser aliado à utilização da tecnologia de taxa variável de inseticidas, permitindo uma aplicação customizada, que varia de acordo com a necessidade de cada talhão.
Com o suporte da agricultura digital, o produtor tem à disposição um conjunto de estratégias-chave que o ajudam no desafio de manter a eficiência dos defensivos por mais tempo.
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