Para não pôr em risco os ganhos de produtividade obtidos com a biotecnologia, o produtor precisa adotar boas práticas agrícolas, como Manejo Integrado de Pragas e áreas de refúgio, que podem ser otimizados com a agricultura digital
A biotecnologia contribuiu para o crescimento da produtividade da soja no Brasil
O primeiro grão de soja chegou ao território brasileiro em 1882, a partir de cultivares trazidas dos EUA. Mas somente em 1914, em Santa Rosa (RS), que oficialmente começa a história dessa oleaginosa no Brasil, segundo José Marcos Gontijo Mandarino, pesquisador da Embrapa Soja. No começo do século passado, os números dessa cultura no País eram bem modestos. Em 1941, a área cultivada se aproximava de 640 ha, com produção de 450 t e rendimento de 700 kg/ha. Apenas no final da década de 1960 que a produção atingiu 1 milhão de t.
Mas de lá pra cá a área plantada e a produção do grão cresceram exponencialmente. Na safra 2019/2020, segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), a produção brasileira de soja atingiu 120,4 milhões de toneladas, colhidas em uma área plantada de 36,843 milhões de ha. A produtividade registrada no ciclo foi de 3.269 kg/ha.
Com esses números, o Brasil retomou o topo da produção mundial do grão. Mas qual foi o segredo deste salto de produção? Basicamente, a disposição do produtor em adotar as melhores práticas agronômicas e o uso de biotecnologias de ponta, aliadas a bons germoplasmas.
Neste post, vamos explicar o quanto os avanços da tecnologia Bt contribuíram para elevar a produção de soja no país e a importância da adoção do Manejo Integrado de Pragas (MIP) na preservação dos ganhos advindos das tecnologias em sementes.
Fique de olho, pois também falaremos sobre como a agricultura digital pode contribuir para facilitar a implementação das boas práticas do MIP em soja. Confira a seguir.
A tecnologia Bt faz com que as plantas resistem a insetos e pragas na lavoura. Isso acontece através da biotecnologia que insere genes de bactéria Bacillus Thuringiensis que são capazes de fabricar uma proteína tóxica para gerar essa resistência.
Desde os primórdios, alimentar uma população que não para de crescer sempre soou como um desafio e tanto, e no início da década de 1990 isso se potencializou: como produzir alimento, usando menos recursos e área, e com maior sustentabilidade? Uma saída seria o crescimento vertical da produção agrícola.
Em 1995, vinha dos EUA um avanço que foi divisor de águas para a cultura. Nascia a primeira soja geneticamente modificada, a Soja RR (Roundup Ready). Os grãos, com essa tecnologia, trazem no gene modificações que conferem à oleaginosa tolerância ao oleaginosa tolerância ao glifosato. Ajuda e tanto para o manejo das plantas daninhas em soja. Com essa tecnologia, o agricultor ganharia em facilidade e flexibilidade de manejo ao usar um herbicida sistêmico de amplo espectro no controle de inúmeras invasoras da lavoura.
Três anos depois, em 1998, o governo brasileiro aprovou a introdução da Soja RR no país. Desde então, o manejo de plantas daninhas na cultura ficou mais eficiente e barato, com consequente aumento de produtividade. Benefícios que levaram os produtores a aderirem amplamente à biotecnologia.
Posteriormente, em 2013, foi lançada no mercado brasileiro outra novidade biotecnológica: a soja Intacta RR2 PROTM, que colocou à disposição do produtor a possibilidade de plantar soja com proteção a pragas de grande prevalência na cultura. Esse produto apresenta o famoso Bt (Bacillus thuringiensis). Uma proteína que, quando as pragas ingerem, se prende a células do intestino do inseto, levando-o à morte. Essa tecnologia é resultado da inserção no DNA da oleaginosa, de um gene da bactéria que expressa uma proteína tóxica para algumas pragas.
“Esta segunda solução biotecnológica proporcionou proteção contra as principais lagartas que atacam a cultura – lagarta-da-soja, falsa-medideira, lagarta-das-maçãs e broca-das-axilas”, explica Marina Menin, engenheira agrônoma e gerente de estratégia de soja da Bayer.
Mas outras novidades estão em curso. De acordo com Marina, aproxima-se o lançamento de uma nova biotecnologia que é uma segunda geração de Intacta. É a soja Intacta 2 Xtend®. “Esta tecnologia é focada na proteção de outras lagartas (Spodoptera cosmioides e Helicoverpa armigera), mas também traz o benefício de não apenas ser tolerante a glifosato, mas também a outra herbicida, o dicamba, incrementando o manejo de folhas largas.”
Para que essa tecnologia chegue ao mercado brasileiro, uma série de etapas regulatórias estão sendo seguidas. Intacta 2 Xtend® foi aprovada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio) em 2018 e está em fase de testes em áreas pré-comerciais.
Segundo Marina Menin, hoje, mais de 96% da área de soja do País tem biotecnologia, considerando um mercado de quase 38 milhões de ha. “Esse movimento de adoção da biotecnologia mostra o valor que essa ferramenta trouxe para a agricultura”, comenta. “Contribuiu para que o Brasil saísse de uma produção de 50 milhões de t do grão no final dos anos de 1990, para cerca de 120 milhões de t em 2020.”
Biotecnologia é a aplicação de tecnologia em organismos vivos, visando interferir no seu material genético ou até modificá-lo (transgenia), sempre com um objetivo específico. O foco é obter o melhoramento de plantas ou até animais e microrganismos.
“O intuito é melhorar seu potencial, ou buscar uma supressão ou proteção a determinada praga, doença ou molécula. Isto se tratando de sua aplicação ao agro, mas esse conceito pode ser aplicado em indústrias de um modo geral e na medicina também”, explica a engenheira agrônoma Thais Albuquerque, CEO da eBarn.
Para ela, a biotecnologia foi fundamental para a evolução da agricultura como se pode ver hoje. “O produtor rural lida com diversos desafios, desde condições climáticas mais adversas até a necessidade de controle de inúmeras pragas e doenças”, diz Thais.
“Se não fosse pelo avanço da biotecnologia somado às pesquisas em germoplasma, no agro, não teríamos os patamares de produtividade que conseguimos alcançar hoje. E o manejo de campo seria muito mais complexo, exigindo, em alguns casos, maior uso de defensivos agrícolas, por vezes sendo até inviável financeira e ambientalmente”, completa.
Com grande contribuição da biotecnologia, dados da CONAB indicam que a soja brasileira obteve grande ganho de produtividade nos últimos 22 anos. Em 1998, quando a soja RR foi lançada, a produtividade era de 2,36 t/ha ou, aproximadamente, 40 sacas/ha. Em 2013, quando a soja Intacta RR2 ProTM foi lançada, a produtividade era de 2,86 t/ha ou cerca de 48 sacas/ha. Já em 2019, verifica-se mais um crescimento significativo da produtividade: 3,24 t/ha ou 54 sacas/ha.
Segundo Marina, esses ganhos carregam a evolução no melhoramento genético e o esforço dos obtentores em trazer novas variedades de soja aos produtores. “A biotecnologia é parte crucial deste aumento, não somente pelo produto em si, mas também pelos benefícios que ela oferece, as quais, indiretamente, ajudam a preservar a produtividade. Exemplo é o menor dano causado por lagartas e o melhor controle de plantas daninhas.”
Entre a primeira soja geneticamente modificada, em 1998, e o lançamento de Intacta RR2 ProTM, houve o incremento de 10% de produtividade da cultura da oleaginosa no País. E com a próxima tecnologia, Intacta 2 Xtend®, a expectativa é de mais um salto de produtividade.
Outro ponto relevante frisado pela gerente de estratégia de soja da Bayer é a questão da redução de custos que a biotecnologia possibilitou ao produtor de soja. Com a adoção de Intacta RR2 ProTM, o agricultor reduziu basicamente em mais de 60% o número de aplicações de defensivos na lavoura.
A biotecnologia pode perder a eficácia ao longo do tempo, isto porque as pragas incidentes em soja, por exemplo, podem apresentar resistência à tecnologia Bt. Segundo Paula Torresan, gerente de transferência de conhecimento da Bayer, pragas naturalmente selecionadas resistentes, incidentes em soja, podem ter a frequência populacional aumentada se cruzadas entre si, o que aumentará o número de insetos resistentes ao Bt na lavoura.
“Por isso, é extremamente importante que boas práticas sejam adotadas para evitar a proliferação de insetos resistentes à tecnologia Bt”, diz Paula. Problema que inclusive já pode ser percebido em algumas regiões do País, em outras culturas Bt, como milho, por exemplo.
A resistência em insetos é semelhante ao processo de resistência a remédios que ocorre com o ser humano. Marina explica que, quanto mais frequente é a exposição da praga a uma determinada tecnologia, aumenta a chance de se ter o desenvolvimento de um organismo que não vai mais morrer com a biotecnologia.
“Se a lagarta fica muito tempo exposta a uma determinada biotecnologia, vamos acelerar a sua modificação genética”, enfatiza.
Por isso, é correto afirmar que, mesmo com a revolução em produtividade que a biotecnologia tem propiciado, isso só tem sido possível onde são realizadas boas práticas agronômicas. Apenas dessa forma que se pode assegurar que os benefícios das sementes com a tecnologia Bt serão prolongados, o que inclui a adoção do Manejo Integrado de Pragas (MIP) e uma de suas principais práticas, o refúgio.
“Quando se pensa no controle de insetos que atacam a soja, a prática do refúgio é mandatória para aumentar o ciclo de vida do produto, preservando o benefício para o qual a tecnologia foi desenvolvida”, reforça Marina.
Confira, a seguir, como as práticas do MIP devem ser aplicadas na lavoura e de que maneira a agricultura digital pode potencializar o manejo de pragas em soja.
Saiba mais: Manejo Integrado de Pragas e resistência: qual o papel da biotecnologia?
Quando o assunto é o Manejo Integrado de Pragas, existem várias práticas possíveis, mas que exigem o conhecimento a fundo das características dos insetos presentes na área e dos tipos de danos que podem causar. De acordo com o nível de infestação e de dano econômico à lavoura é que se define a estratégia de controle, afirma Thais.
Para se estabelecer qualquer ação de controle, deve ser feito o monitoramento das pragas incidentes na área. O MIP preconiza medidas culturais, biológicas e químicas, além da adoção da biotecnologia e do tratamento de sementes. As medidas adotadas no MIP devem ser feitas de forma coordenada e harmônica, com base no custo-benefício.
Dentre as práticas adotadas nesse sistema, o refúgio é ferramenta estratégica para evitar a resistência das pragas à tecnologia Bt. Confira, a seguir, o que é o refúgio em soja e como ele deve ser implementado de maneira estruturada na lavoura.
Sem o manejo adequado, pragas resistentes à tecnologia Bt podem ter sua frequência aumentada nos talhões
Componente do Manejo Integrado de Pragas, o refúgio estruturado consiste em reservar, na lavoura, com tecnologia Bt, áreas cultivadas com plantas não Bt da mesma espécie.
Paula explica que, com esse método, é possível retardar a seleção de insetos resistentes ao manter, na propriedade, uma população de pragas suscetíveis e sensíveis às proteínas Bt. Dessa forma, esses insetos podem acasalar com indivíduos resistentes e transmitir a suscetibilidade do Bt a gerações futuras.
Mas não basta um produtor adotar o refúgio, e a propriedade ao lado, não. “Preservar a tecnologia Bt é uma responsabilidade de todos os produtores”, ressalta Paula.
Para implementar as áreas de refúgio estruturado, os produtores precisam de planejamento, seguindo regras específicas para a sua implantação.
Em soja, recomenda-se que 20% da área total de plantio seja destinada ao refúgio (área não Bt), com distância máxima de 800 metros entre as culturas Bt e não Bt. Essa distância máxima é que possibilita o acasalamento das mariposas e permite a manutenção de populações de lagartas suscetíveis.
Existem quatro configurações gerais para se implantar áreas de refúgio na propriedade: em bloco; em faixas; em campo próximo; e em bordadura/perímetro.
Thais relata que, tratando-se de tecnologias Bt, o refúgio deve utilizar variedades convencionais ou apenas com biotecnologia de tolerância a herbicidas (previamente recomendadas pela empresa detentora da biotecnologia).
É possível aplicar controle químico nas áreas de refúgio, mas que deve ser realizado apenas quando o nível de dano econômico indicado para a cultura for atingido. Neste caso, não se recomenda o uso de inseticidas à base de Bt.
Thais observa ainda que, nas áreas de refúgio, “o produtor deve fazer a rotação de princípios ativos, principalmente no controle de doenças e plantas invasoras”.
“A biotecnologia veio para somar, portanto não deve ser encarada como uma solução isolada. O produtor tem que entender as limitações que temos para o cultivo hoje, sempre respeitando os parâmetros técnicos estabelecidos, integrando os manejos, além de tomar ações em conjunto”, enfatiza Thais.
Para assegurar a longevidade da biotecnologia na lavoura, outra tecnologia, a agricultura digital disponibiliza inúmeras ferramentas, tanto para otimizar a realização das práticas do Manejo Integrado de Pragas quanto na implantação de áreas de refúgio.
Ao enviar imagens de satélite e mapas, a plataforma Climate FieldViewTM, da Bayer, apoia o produtor na tomada de decisão sobre onde implementar a área de refúgio estruturado no talhão. Paula Torresan lembra que, de posse das imagens, fica mais fácil determinar a porcentagem de sementes a ser utilizada e a distância entre os talhões Bt e não Bt que deverão ser plantados.
Outro ponto ainda é que, ao importar mapas de solo para a plataforma, é possível posicionar a variedade escolhida, de acordo com o ambiente mais ou menos fértil. É sabido que, muitas vezes, o produtor pode optar por escolher uma área menos fértil para a implementação do refúgio, uma vez que antigamente as variedades não eram tão produtivas. “Contudo, hoje, com o advento do melhoramento nos germoplasmas, posicionar boas variedades de refúgio em ambientes de alta fertilidade pode ser chave para se obter resultados positivos na colheita”, pontua.
Além disso, por meio dessas imagens, geradas ao longo de toda safra, é possível acompanhar o desenvolvimento da cultura, tanto da soja Bt quanto da soja da área de refúgio. Desta maneira, por meio dos mapas, é possível identificar se existe algum problema (indicado pela variabilidade na escala de cores) em alguma parte do talhão, que, ao ser investigado, pode, inclusive, ser um ataque de pragas na área não Bt, por exemplo.
Já os agricultores que possuem a experiência completa com a Climate, através do Plano Plus e a utilização do FieldViewTM Drive, podem realizar o mapeamento de sua operação de plantio. “Esta solução permite verificar se a população de plantas está adequada e, ao final do ciclo, permite calcular a produtividade linha a linha plantada. Assim, o produtor terá condições de entender a performance de cada variedade e de cada talhão da lavoura, sem precisar colher separadamente”, diz Paula.
O registro detalhado das informações da safra, realizado pelo FieldViewTM, também é de grande valia para se ter uma visão do desempenho do cultivo ao longo dos anos. “As safras podem ser estudadas, o que nos oferece condições de interpretar a performance de uma biotecnologia, o potencial de uma variedade ou híbrido e sobre a eficiência dos produtos que estão sendo utilizados no campo”, destaca Thais.
Ela lembra que outras funcionalidades, como as marcações georreferenciadas, também contribuem para a correta aplicação de defensivos, quando necessárias, pois apoiam o produtor a definir com precisão onde pulverizar. “A tecnologia permite localizar no mapa os locais com maior pressão ou pontos de atenção, que podem ser ocasionados por determinada praga ou doença”, conclui.
Quando se fala em futuro da produção agrícola, a biotecnologia e a agricultura digital, cada vez mais, caminham lado a lado, o que é bom para a produtividade da lavoura e para a sustentabilidade do negócio.
Saiba mais: Afinal de contas, o que é a Agricultura Digital?
O FieldView™ é uma plataforma de agricultura digital que auxilia o produtor a coletar e visualizar informações sobre seus talhões, para que a tomada de decisão seja precisa, minimizando prejuízos. Curtiu o nosso conteúdo? Deixe seu comentário abaixo, pois a sua opinião é muito importante para nós. E você, que utiliza o FieldView™, compartilhe a sua experiência. Para mais dicas, siga as nossas redes sociais (@climatefieldviewbr).